Performance plural, experiência singular






A peça “Janaína, não seja boba”, em sua última semana na cidade, traz para Curitiba o gênero da opereta, precursora da comédia musical

Texto: Roberta Gonçalves
Fotos: Gillo Brunisso




CURITIBA, 25/02/2019

Ainda dá tempo de conferir, até 3 de março, a opereta “Janaína, não seja boba”, no teatro Barracão Encena, centro de Curitiba. Dirigida por Roberto Innocente e com arranjos musicais do maestro Alessandro Sangiorgi, a peça apresenta a leveza e a versatilidade típicas desse tipo de espetáculo. Considerada mais “democrática” do que as óperas clássicas, a opereta surgiu no século 19 e é uma espécie de precursora da comédia musical. Trata-se de um gênero teatral mais curto, leve e lisonjeiro, que costuma fisgar o público exatamente por esse perfil que flerta com a cultura popular e a erudita, transitando entre a fala e o canto. Esses são alguns dos elementos nos quais essa montagem curitibana aposta para atrair a atenção da plateia (e consegue).








A cantora Miranda (Luana Godin) em cena de "Janaina, não seja boba"


O enredo traz amores impossíveis, intrigas e reviravoltas. Porém, sem o melodrama cravado que normalmente caracteriza os grandes clássicos. Aqui, a leveza dos personagens da opereta parece até debochar um pouco da extravagância das óperas tradicionais, gerando empatia com o público e arrancando boas risadas da plateia. Tudo se passa na cidade de Angra dos Reis, Rio de Janeiro, na década 1920. Por lá, o maestro Martins tenta encenar sua peça “Janaína, não seja boba”. A sobrinha do prefeito Vicente Molestini, que também se chama Janaína, é apaixonada pelo estudante Chico, mas seu namoro não é permitido pelo tio. Outro casal que vive um amor impossível (Miranda e Francisco) chega à Angra do Reis fugindo de Niterói, onde ela, por ser cantora de teatro de revista, não é aceita pela tradicional família dele, como a própria personagem explicita durante a peça, em uma cena com o pai de seu noivo: “Ser mulher de teatro é desonra, diz o senhor, com desprezo e ironia”. Neste trecho, é impossível não remeter à resistência que nomes conhecidos da época, como Angela Maria e Carmen Miranda, sofreram de suas famílias por atuarem como atrizes do teatro de revista e cantoras de rádio.








Na peça, Janaina e Chico vivem um amor impossivel


Essa não é a primeira vez que o diretor Roberto Innocente e o maestro Alessandro Sangiorgi trabalham juntos. Trata-se de uma parceria que já vem de longa data, desde 2005, quando atuaram no Paraná em montagens como La serva padrona e L’occasione fa il ladro, entre outros projetos. As obras italianas, inclusive, lembram que ambos nasceram na terra de Dante Alighieri. Roberto Innocente, de Padova, no Vêneto, é ator, dramaturgo, diretor, cenógrafo e artista plástico. Especializou-se em ópera lírica e commedia dell’arte. Alessandro Sangiorgi, que assina 27 músicas da peça, nasceu em Ferrara, na Emilia-Romanha. Por nove anos, foi regente titular e diretor artístico da Orquestra Sinfônica do Paraná. Na Europa, formou-se pelo Conservatório de Milão e atuou em várias orquestras internacionais.


As referências da Itália marcam presença também na montagem de “Janaína, não seja boba”, com temas revisitados da ópera Tosca, de Giacomo Puccini, além de citações de L'elisir d'amore, de Gaetano Donizetti , e Il Barbiere di Siviglia, de Gioacchino Rossini. Porém, as marcas verde-amarelas também estão lá, como no tema musical que embala o malandro Tiaguinho, lembrando melodias de Noel Rosa. Além disso, os tipos sociais do Rio de Janeiro dos anos 1920 são bem marcados, como a fofoqueira na janela deslumbrada pelo malandro e a portuguesa proprietária de um negócio na cidade.










O maestro Martins (à esquerda) e o prefeito Vicente Molestini (à direita)


A obra – financiada pelo Profice (Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura do Paraná) e com apoio da Copel – teve uma seleção apurada dos atores, com análise de currículos, entrevistas e oficinas de canto e interpretação. Dentre os dez profissionais em cena, chama atenção a voz afinadíssima da cantora Miranda e a atuação divertidíssima do prefeito Vicente Molestini.


Junto dos colegas de elenco, durante quase 2 horas de encenação, com 15 minutos de intervalo, eles criam uma forte cumplicidade com a plateia. Essa empatia se abala levemente na segunda pausa do espetáculo, quando os atores saem do palco, e as luzes se apagam para ajustes técnicos. Embora sejam apenas 5 minutos, nota-se um certo vácuo no público, quebrando um pouco o ritmo empolgado dos espectadores até ali. Na volta, a versatilidade dos atores, que cantam, recitam e brincam, retoma o tempo perdido, gerando a sensação única de satisfação, seja para o elenco, que cumpriu sua missão, seja para a plateia, que sai do teatro com a alma mais leve.










Opereta “Janaína, não seja boba”






Quando:

Até 3 de março, de quarta a sábado, às 21hs. Domingo, às 19hs


Local:

Teatro Barracão Encena / Telefone: (41) 3223-5517 / Rua Treze de Maio, 160 - Centro, Curitiba


Preço:

R$ 20,00 (inteira) R$ 10,00 (meia-entrada)